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BE questiona empreendimento imobiliário projetado para a Praia Grande (Silves)

 Cecília Honório e Luís Fazenda dirigiram ao Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, um conjunto concreto de questões sobre o mega empreendimento imobiliário projetado para a Praia Grande (Silves):

- O Ministério considera que a construção deste empreendimento é compatível com as obras de requalificação da Lagoa dos Salgados financiadas com erário público;

- O Ministério considera que a Declaração de Impacte Ambiental (DIA) favorável condicionada, nas condições acima referidas, está de acordo com o princípio da precaução? Como pode a Secretaria de Estado emitir tal declaração se admite a existência de falhas de conceção que não permitem avaliar cabalmente o projeto;

- Qual o número de campos de golfe já existentes no concelho de Silves e na região? O Ministério tem conhecimento do empreendimento imobiliário que envolvia a construção de

campos de golfe, localizado a menos de 1km do projeto para a Praia Grande, e que faliu? Face a estes dados, como justifica o Ministério a significância económica deste novo empreendimento;

- Que medidas vai o Ministério tomar para garantir a preservação da natureza e dos serviços ecológicos desta importante área.

 

Foi emitida, pela Secretaria de Estado do Ambiente, no dia 30 de outubro de 2013, uma Declaração de Impacte Ambiental (DIA) “favorável condicionada” ao mega empreendimento turístico da Praia Grande, em Silves. O empreendimento contempla mais de 4000 camas, três hotéis, dois aldeamentos, zonas comerciais e um campo de golfe e é promovido por grupos económicos ligados ao Grupo Galilei (ex-Sociedade Lusa de Negócios), tendo contado com o apoio explícito da Câmara Municipal de Silves.

Para salvaguardar a natureza e o interesse público neste caso, o Bloco de Esquerda apresentou já o Projeto de Resolução 483/XII que “recomenda ao Governo medidas para a proteção da Lagoa dos Salgados (Albufeira e Silves) ”.

O mega empreendimento localiza-se no litoral, junto à Lagoa dos Salgados, num local que constitui uma Área Importante para Aves (IBA) reconhecida pela Sociedade Portuguesa para o Estuda das Aves (SPEA), pela Liga para a Proteção da Natureza (LPN), pela Quercus e pela BirdLife Internacional, entre outras, devido às populações de aves aquáticas de espécies ameaçadas que alberga. Apesar de, em conjunto com o sapal de Alcantarilha, o cordão dunar da Praia Grande e os terrenos agrícolas limítrofes, constituir uma área natural de conservação prioritária e um corredor ecológico identificado no Plano Regional de Ordenamento do Território, a área permanece, até hoje, sem estatuto legal de proteção. Não obstante a ausência de um estatuto de proteção legal, mas visando melhorar e garantir o abrigo que a Lagoa dos Salgados garante às espécies de aves que a visitam dentro e fora de período de nidificação, foram iniciadas as obras de requalificação da Lagoa. A requalificação da Lagoa, que permite, entre outros objetivos, regular o caudal da mesma e modelar os fundos para a criação de fundões e ilhotas que permitam aumentar a diversidade de zonas de abrigo para aves, é um projeto que resulta da parceria entre as Águas do Algarve SA e a Agência Portuguesa do Ambiente, Faro (APA), um organismo público.

A Secretaria de Estado do Ambiente admite, na DIA de 30 de outubro, que “existem falhas de conceção, que não permitem avaliar cabalmente o projeto, pelo que solicitam à Autoridade de AIA a necessidade de realizar um estudo integrado”. Essas falhas tinham já sido apontadas, entre outras organizações, pela SPEA, por exemplo, num comunicado de imprensa de 23 de julho de 2013 sobre o Estudo de Impacte Ambiental (EIA) em que a DIA se baseia: o EIA “Estuda apenas parte do empreendimento proposto, a denominada Unidade de Execução 1, deixando para mais tarde a avaliação do impacte de outras partes do projeto; 2. Não estuda alternativas ao Plano de Pormenor aprovado em 2007, não permitindo avaliar a relevância de outras soluções de desenvolvimento para área da Praia Grande; 3. Caracteriza a situação de referência quanto à biodiversidade de forma insuficiente, nem sequer referindo que a área tem valores naturais suficientes para ser classificada como Rede Natura 2000; 4. Na identificação dos impactes, desvaloriza os impactes fortemente negativos sobre a água, os solos de elevada aptidão agrícola, a biodiversidade, o ordenamento do território e os serviços de turismo de natureza; 5. Por outro lado, sobrevaloriza os impactes “positivos” na economia local, mas não entra em linha de conta com a atual conjuntura económica, nem com as novas tendências dos mercados turísticos”.

É inusitado que um estudo de impacte ambiental sobrevalorize aspetos económicos quando não consegue, ou não quer, sequer cumprir seriamente a sua função principal - avaliar o impacte ambiental de um dado projeto. Mais inusitado se torna que a DIA da Secretaria de Estado do Ambiente, reconhecendo essa lacuna, saliente que «o contributo do empreendimento é determinante para a consolidação da vocação turística do concelho, através do aumento, da qualificação e da diversidade de oferta dos equipamentos turísticos, conforme é objetivo do Plano Estratégico de Desenvolvimento de Silves».

O ano de 2013 foi um ano de recuperação, por várias razões, para o Turismo em Portugal. Não obstante, “a taxa de ocupação média por cama, na hotelaria do Algarve, no segundo trimestre de 2013, situou-se nos 45,7%” (TURISMO DO ALGARVE - boletim trimestral, n.º 2, setembro 2013) - ou seja, a taxa de ocupação no 2º trimestre ficou a menos de metade da capacidade do distrito. Argumentar que, nestas condições, um mega-empreendimento túristico com 4000 camas e dois hotéis vai contribuir para o desenvolvimento económico é absurdo.

Em 2008 existiam no Algarve 26 campos de Golfe em fase de exploração (dos quais 21 com 18 buracos, dados da CCDR Algarve); presentemente há, pelo menos, 34 Resorts que operam 38 campos de golfe (dos quais 33 com 18 buracos). Ora neste ano de recuperação para o Turismo, o número de voltas vendido por campo de 18 buracos não foi significativamente superior ao número de voltas vendido no período homólogo em 2011 (dados da IMPACTUR, Indicadores de Monitorização e Previsão da Atividade Turística: Relatório do Trimestre Flutuante Mai/Jun/Jul de 2013 - Algarve). Aliás em 2011 os campos algarvios ultrapassaram um milhão de voltas vendidas (1.003.979 voltas), um valor semelhante ao número de voltas vendido em 2008 (1.078.235) (dados do Turismo do Algarve citados por LUSA/Sol, 6 de fevereiro, 2012) - apesar de, face a 2008, existirem mais 12 campos de 18 buracos disponíveis. É no mínimo utópico face a estes números, pensar que reside numa maior oferta de campos de Golf a chave para o desenvolvimento económico do distrito.

Poderá, finalmente, argumentar-se que não se trata do distrito, mas do concelho de Silves ou da região da Praia Grande em particular. Mas Silves já tem dois Resorts de Golfe de 18 buracos e, a 500m do local escolhido para o novo mega empreendimento, no lado leste da Lagoa dos Salgados (concelho de Albufeira), situa-se o empreendimento dos Salgados que integra um hotel, apartamentos e um campo de golfe (que invadiu parte do leito da zona lagunar). O complexo imobiliário está fechado há mais de um ano porque faliu.

Mesmo considerando que o potencial impacte económico de um projeto deve pesar em detrimento do seu impacte ambiental não há razão nenhuma para crer que o mega empreendimento turístico da Praia Grande a ser criado venha a contribuir de forma determinante para a vocação turística do concelho ou do distrito em que se insere - embora tudo leve a crer que o impacte ambiental do projeto será negativo para região em que se insere e que comprometerá o impacte ambiental positivo que as obras de requalificação da Lagoa dos Salgados financiadas pelo erário público visam obter.

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