Intervenção de Ana Natacha Álvaro, deputado municipal do Bloco de Esquerda, na sessão solene da Assembleia Municipal de Lagos comemorativa do 25 de Abril.
Bom dia a todas e a todos!
Bom dia ao Senhor Presidente da Assembleia Municipal de Lagos!
Bom dia à Senhora Presidente da Câmara Municipal de Lagos!
Reunimo-nos, mais uma vez, para comemorar em conjunto o 25 de Abril.
Um marco na nossa história partilhada, na nossa memória comum e nas nossas vidas individuais e coletivas.
Porém, o dia não pode existir só para celebração, tem de existir para reflexão.
Acho que podemos concordar que uma das grandes vitórias do 25 de Abril foi a EDUCAÇÃO. O acesso público ao conhecimento, através das escolas, de centros culturais, de manifestações artísticas variadas e alargadas.
Pergunto-me constantemente para onde é que está a ser canalizado esse conhecimento.
Não faz sentido, em pleno século XXI, continuarmos a confrontar-nos com determinadas realidades.
Não faz sentido toda uma população mais formada, mais preparada e mais consciente cometer os mesmos erros do passado.
Não faz sentido o movimento feminista voltar em força às ruas para lutar por direitos que já deviam estar mais do que adquiridos e para denunciar casos de violência machista contínua que já deviam estar mais do que extintos.
Não faz sentido um mês pela prevenção dos maus tratos na infância, como é que AINDA é necessário?!
Não faz sentido o Serviço Nacional de Saúde carecer de recursos humanos e ferramentas de trabalho, quando devia ser restruturado, fortalecido e valorizado.
Não faz sentido investir numa lei de transferência de competências para os municípios que abre caminho a mais privatizações.
Não faz sentido a forma como se aplaude a incompetência, premiando chefias incapazes e desumanas, em todas as áreas da nossa sociedade.
Não faz sentido revoltarmo-nos com as greves das classes trabalhadoras, porque prejudicam o nosso dia-a-dia, em vez de nos juntarmos a elas e lutarmos todos por condições dignas de trabalho.
Não faz sentido voltarmos ao problema da falta de habitação, em prol do turismo e da inflação imobiliária.
Não faz sentido discutirmos a possibilidade de um Museu dos Descobrimentos, que conta a mesma narrativa, com as mesmas personagens e os mesmos pontos de vista; como se voltássemos a 1940 e à “Exposição do Mundo Português”;
Não faz sentido cairmos novamente no discurso do medo e cantarmos constantemente o “Coro das Velhas” do “Cá se vai andando com a cabeça entre as orelhas”.
Porque os sinais estão todos aí outra vez:
O controlo apertado em nome da “nossa segurança”;
O ufanismo patriótico na reprodução de tradições e costumes que passaram do prazo há muito;
A desconfiança em relação ao outro: porque é cigano, porque é homossexual, porque é muçulmano, porque é qualquer coisa diferente;
Os serviços públicos a desaparecerem: porque dão prejuízo, porque não têm qualidade, porque não têm utilizadores suficientes… E lá vamos nós nas narrativas dos números, das estatísticas e da Comissão Europeia.
Trump nos Estados Unidos da América, Putin na Rússia, Erdogan na Turquia, Viktor Orbán na Hungria, Bolsonaro no Brasil,…
E o círculo vinga, e nós sabemos onde nos leva, porque as ondas cíclicas não são só económicas, temos todas as histórias nacionais e internacionais para nos mostrarem isso.
O QUE FAZ SENTIDO é pegarmos no conhecimento acumulado, na inteligência emocional, nos ares do 25 de Abril e continuarmos a construir juntos uma sociedade melhor para todas e todos nós!
A democracia não é uma casa sólida que habitamos desde o 25 de Abril, a democracia pode ruir a qualquer momento. Cabe-nos continuar a preservá-la, mudá-la e aguentá-la. Os pilares não são só os governantes. Somos todos alicerces, mas se nem toda a gente trabalha na sua construção, há partes que podem ruir…
A ideia “25 de Abril sempre” não pode sobreviver da repetição oral no dia da sua celebração, tem de viver de ações, decisões e EVOLUÇÕES! Não podemos fazer sobreviver o 25 de Abril, temos de VIVER o 25 de Abril. Todos os dias. Sempre!